Senhor Cardeal Patriarca de Lisboa, Dom Manuel Clemente,
A nossa primeira palavra é de gratidão.
Diz-se que o agradecimento é a memória do coração. E de quantas memórias se faz a relação da Capela do Rato com o Sr. D. Manuel Clemente…
Após a resignação de D. José Policarpo, ainda a escolha do Bispo de Lisboa não tinha sido anunciada e já um grupo da comunidade, do qual fazia parte o nosso saudoso José Alberto, se fazia à estrada em direção ao Porto. Apesar de não ter havido audiência marcada, o grupo participou numa missa celebrada pelo então Bispo do Porto, com o intuito de no final lhe deixarem uma palavra de reconhecimento e encorajamento para o regresso a casa – a Diocese de Lisboa.
Na altura da nomeação como Bispo de Lisboa era então Capelão o nosso querido
D. Tolentino de Mendonça, que conhece de há muitos anos. Cruzam-se dois homens de fé, da academia e da cultura num espaço que reconhecidamente valoriza a arte e a cultura como linguagens de mediação para a dimensão espiritual. Surgem, assim, novas possibilidades de relação.
A Capela do Rato tem uma comunidade singular, marcada por uma história de mais de 50 anos. Apesar de não sermos uma comunidade territorial, une-nos o espírito de Koinonia. É uma comunidade que se caracteriza pela grande variedade de dons, pelo respeito pelos diferentes carismas e vocações, convocando e valorizando a intervenção das/os leigas/os na Igreja e na Sociedade. Procuramos ser uma Igreja em saída, em direção a realidades sociais, económicas, geográficas, espirituais e existenciais que vão para além daquelas que são as das pessoas que normalmente frequentam a capela.
São numerosas as manifestações de consideração e abertura a esta comunidade sui generis por parte do Sr. D. Manuel Clemente. Por exemplo, um dos serviços que prestamos, desde há muito, é precisamente a catequese de adultos e a preparação para o Crisma. Todos os anos um grupo de pessoas inquietas e desejosas de aprofundar a experiência cristã procura na Capela sinais e referências menos tradicionais de ser Igreja, como diz o nosso querido Capelão, Pe. António Martins, com quem igualmente mantém de há muito uma relação de proximidade. Não podemos, por isso, deixar de salientar e agradecer a permanente disponibilidade e entusiasmo para administrar os sacramentos do Batismo e do Crisma, tal como hoje aconteceu.
Mas recordamos também o seu apoio quando ousámos fazer diferente mais recentemente. A maneira como acompanhou o nosso percurso sinodal e como serenamente aceitou o convite para a entrega presencial da nossa síntese, cujo caderno de encargos não ignorava sugestões de reforma na Diocese; a curiosidade e o agrado com que visitou a exposição comemorativa dos 50 anos da Vigília pela Paz; e o apoio aos debates dedicados ao tema dos abusos sexuais de crianças na Igreja em Portugal.
Percebemos o respeito do Sr. D. Manuel pela singularidade de caminho que a comunidade percorre e sinceramente lhe agradecemos não diluir a nossa identidade particular no conjunto da Diocese.
Na verdade, no curso dos dias, ao longo destes dez anos, a relação cimentou-se. De tal maneira, que em 2021, no Curso de Filosofia, Literatura e Espiritualidade apresentou o Livro “Repensar Portugal” do Pe. Manuel Antunes. Curiosamente o curso desse ano intitulava-se “Com a Prata da Casa”. Assim se selava a forma como também o respeitamos e consideramos.
Em sinal da nossa gratidão, amizade, comunhão e unidade, gostaríamos de lhe entregar uma pequena lembrança da Capela do Rato – estamos em crer que será inevitável lembrar-se de nós sempre que para ela olhar – Trata-se de um azulejo com o nome “perfil” da artista plástica Lourdes Castro. O perfil do azulejo é o mesmo do rosto do Anjo de Berlim – uma sombra auto-retrato da autora em 1978 – que foi instalado no nosso altar em 2010 e que é atualmente um símbolo identitário da Capela.
Rezamos pelo Sr. D. Manuel e pelas suas intenções, nomeadamente para que a Jornada Mundial da Juventude seja uma oportunidade para o rejuvenescimento da Igreja em Portugal. Que Nossa Senhora da Bonança o proteja e que Deus, Nosso Pai, o conduza sempre como mensageiro da justiça e da paz; e o cubra de bênçãos para maior benefício de todas e todos que a cada tempo lhe estão confiados.
Por fim, pedimos-lhe também a bênção para esta comunidade, para que mantenha a esperança de que o “tempo de escombros” que vivemos, seja um tempo oportuno – kairos – para escutar com humildade o que o Espírito nos revela nos sinais dos tempos presentes e convida a fazer para viver mais radicalmente o Evangelho.
Capela do Rato, aos 25 de Junho de 2023
@ Fotos: Manuel Lemos