Para uma Igreja sinodal:
Faz-se caminho a andar

Neste início de ano pastoral, quero saudar-vos e convocar-nos para o recomeço das celebrações eucarísticas na nossa comunidade da Capela do Rato, partilhando convosco preocupações, esperanças e desafios. Somos uma comunidade que quer continuar a cumprir-se na escuta do Espírito, de modo inclusivo e corresponsável, atenta às urgências do mundo de hoje, que são também as nossas.

O confinamento devastou a participação presencial, criando profundos efeitos negativos de indiferença, desinteresse, acomodamento. Os ritos e os sacramentos (reconciliação, eucaristia) passaram a ser marginais em tantas vidas pessoais. As transmissões à distância, mantendo pontes, criaram hábitos individualistas e privados. Não é a mesma coisa a participação concreta, corpórea, local, e seguir a eucaristia diante de um ecrã, em casa, no meio de outras atividades domésticas. Temos em mãos o enorme desafio de reorganizar a nossa vida litúrgica, com novas propostas, outras motivações, novas linguagens, com imaginação e criatividade

No presente ano pastoral, convido cada um e cada uma de vós a valorizar/recuperar a sua participação presencial. Ao longo do ano, em cada celebração, vamos valorizar um gesto/um rito, uma oração, um momento, de modo a consolidar uma maior consciência e responsabilidade na participação eucarística. Queremos (re)edificar a centralidade da eucaristia na vida da nossa comunidade. Somos uma pequena comunidade marcada por uma qualidade participativa, pelo prazer de estarmos juntos, pela comunhão de afetos. Queremos estar atentos aos mais ausentes, não esquecendo aquelas e aquelas que caminharam connosco.

Precisamos de saber conjugar, com discernimento e sabedoria, a alegria festiva de estarmos juntos com a necessária hospitalidade do silêncio, condição necessária a qualquer escuta qualificada, do outro e da Palavra de Deus que é proclamada e celebrada. Precisamos de aliar comunicação com discrição, Palavra e silêncio. O espaço celebrativo da Capela esteja marcado por um ambiente de recolhimento orante, que possa acolher, sem agredir, cada pessoa. E isso depende da atitude de cada um(a) de nós. Desde que entramos na Capela do Rato, todos os nossos gestos e palavras são preparação da eucaristia.

O querido Papa Francisco convoca toda a Igreja, a partir das dioceses e das comunidades locais, a uma ampla consulta das bases, iniciando um processo sinodal que culminará em 2023 com a assembleia do Sínodo dos Bispos. Estamos perante um ousado processo de revitalização e concretização da corresponsabilidade de todos os fiéis na tomada de decisões, na sequência da renovação conciliar. Todos os crentes (fiéis e pastores) são chamados a tomar a palavra, escutando-se mutuamente na verdade e escutando o que o Espírito nos diz em nossas consciências. De outubro a março, somos chamados a concretizar um processo de escuta, de tomada de palavra, de discernimento pessoal e comunitário. Escutando os mais afastados, aqueles que não têm voz, os jovens, as mulheres, as periferias existenciais, os não crentes.

Pela qualificação dos seus leigos, pela tradição do diálogo entre crentes e não crentes, pela abertura e integração das periferias existenciais, com os seus meios técnicos e as suas competências, a Comunidade da Capela do Rato não pode deixar de se cumprir neste processo de consulta sinodal. Nos próximos seis meses as nossas energias estarão concentradas na concretização deste caminho conjunto. Brevemente será convocado um conselho da Comunidade para agilizarmos este processo e criarmos uma equipa de coordenação.

A partir de meados de janeiro, voltaremos a concretizar mais uma edição do curso «Filosofia, Literatura, Espiritualidade», marca de qualidade da Capela do Rato no seu diálogo com a cultura contemporânea, cruzando saberes e experiências.

Desafios e oportunidades não nos faltam. O futuro comum depende do compromisso, no presente, de cada um e de de cada uma de nós. Como canta o poeta espanhol Antonio Machado, «Caminhante não há caminho; faz-se caminho a andar».

E só caminhando juntos faremos o nosso caminho.

O meu abraço
P. António Martins