«É o mesmo Espírito que opera tudo em todos», pois em cada pessoa, em cada um, se manifestam os dons do Espírito, a colocar as nossas competências, saberes, experiências de vida, o dom de nós mesmos, seja qual for a nossa condição, ao serviço do bem comum».
Na celebração de Pentecostes, a Ana Fragoso foi investida publicamente no ministério de acólita. Partilhamos algumas fotos que expressam a alegria da Ana, do Capelão, da família e de toda a Comunidade por este acontecimento de inclusão e de unidade na diversidade.
ADMONIÇÃO SOBRE A ALVA
A alva é a veste branca comum a todos os ministros na celebração litúrgica: bispos, presbíteros, diáconos, leitores e acólitos (cf. IGMR 336).
Deriva da veste antiga com o mesmo nome, Alva, era branca e descia até aos pés. Toda a gente a usava na vida diária, como acontece ainda hoje entre os árabes.
A partir de certa altura perdeu-se o uso, mas permaneceu na liturgia, com um sentido simbólico, expressando o tempo diferente da celebração.
O branco é sinal de vitória e de ressurreição, como anuncia o Apocalipse: Caminharão comigo
vestidos de branco, (…) e não apagarei o seu nome do Livro da Vida (cf. Ap 3,4-5).
A túnica branca tem também um sentido batismal, como símbolo do re-nascimento em Jesus Cristo.
Recorda aos que servem, os ministros, o seu próprio batismo, nos símbolos da luz, a graça de Cristo e da veste branca, quantos em Cristo foram batizados, (…) de Cristo foram revestidos, nas palavras de Paulo aos Gálatas. (Cf Gálatas 3, 27)
E, em cada celebração, todos nós, assembleia celebrante de batizados, temos visualmente presente o nosso compromisso e o dom da graça batismal.
(Rito da nomeação dos acólitos nas paróquias)
Queremos valorizar este ano a Solenidade de Pentecostes, a encerrar e a atualizar o tempo pascal (porque da Páscoa nunca saímos), com um toque mais festivo do que o habitual; um toque de «excesso» que marque a diferença deste dia. O «excesso» vem, antes de mais, bela decoração: um excesso de flores vermelhas (e aqui não há clubes preferidos, ainda que para tantos haja festa nas ruas…), a encantar-nos a visão e o coração. Vivemos, na quinta feira, uma bela vigília de Pentecostes, nunca antes celebrada (creio) nesta Capela. Bela em tudo: na preparação, no canto, na participação, na decoração, na generosidade de tantas pessoas que a prepararam, a concretizaram e a celebraram. E tantas mensagens de apreço e de agradecimento recebi. Hoje, na Solenidade de Pentecostes, a celebração da beleza e da inspiração do Espírito continua. E com gestos e acontecimentos também novos na nossa comunidade.
Recordo a beleza e a profundidade de algumas passagens bíblicas das leituras proclamadas quinta. Com o profeta Joel, pedimos um Pentecostes permanente para jovens e anciãos, num fecundo diálogo inter-geracional que enriquece a Igreja e a sociedade: «Derramarei o meu espírito sobre todo o ser vivo: vossos filhos e filhas profetizarão, os vossos anciãos terão sonhos e os vossos jovens terão visões» (Jl 2). Filhos e filhas a profetizar, ancião a ter sonhos, jovens a ter visões, todo o ser vivo a receber o Espírito, a respiração da vida. Que sonho de Igreja, que visão de futuro, que desejo de profundidade. E se não sabemos, se não conseguimos, se não compreendemos, se não nos sentimos capazes, consola-nos S. Paulo: «Também o Espírito Santo vem em auxílio da nossa fraqueza, porque não sabemos o que pedir nas nossas orações; mas o próprio Espírito intercede por nós com gemidos inefáveis» (Rm 8). Não nos sintamos desamparados por mais densada e profunda que seja a nossa fragilidade: O Espírito Santo vem em auxílio da nossa fraqueza. Ele é o nosso socorro, a nossa força, a nossa consolação, a nossa inspiração, o sentido profundo de Deus (o instinto de santidade) que nos habita.
Paulo evoca a ordem social greco-romana para evangelicamente a subverter pela novidade do Espírito. A revolução cristã não é ideologia, é prática fraterna, continua revolução (conversão) das consciências e dos comportamentos. A experiência eclesial, a cumprir-se inclusiva, supera (subverte) a ordem social vigente, as identidades de origem: «Na verdade, todos nós – judeus e gregos, escravos e homens livres – fomos batizados num só Espírito, para constituirmos um só Corpo» (1 Cor 12,13). Noutra passagem, S. Paulo alarga as polarizações e as lógicas binárias com que a sociedade, redutoramente, se nomeia: «não há judeu nem grego, escravo ou livre, homem ou mulher, porque todos vós sois um só em Cristo» (Gl 3,28). E poderíamos continuar, atualizando: não há heterossexuais nem homossexuais, brancos ou negros, nacionais ou refugiados, pessoas eficientes ou pessoas com deficiência, porque todos somos uma única humanidade em Cristo.
O encontro com Cristo cria novas identidades que superam as de origens, suscitam uma nova condição, a cristã que subverte todas as outras. Paulo ensina-nos, hoje, a superar as lógicas binárias com que a sociedade se nomeia e exclui. Perante Cristo todas as identidades se relativizam e se superam. A comunidade cristã ou é inclusiva das diferenças, da condição própria de cada pessoa, ou se nega a si própria, e se torna «mundana», espelho das polarizações e das dicotomias sociais. Porque somos/fomos batizados num só Espírito para construirmos um só corpo.
Pela fecundidade e inspiração do Espírito Santo, a Igreja continuamente se renova, se estiver atenta ao sopro silencioso do Espírito, ao fogo que atiça as consciências. Na escuta atenta e no discernimento comunitário, percebemos os apelos do Espírito no concreto das nossas vidas e das nossas possibilidades. Porque o Espírito age na fragilidade da nossa humanidade, como fermento a levedar a massa/o barro que somos. Na escuta do Espírito, na escuta das próprias pessoas, percebemos por onde passa a renovação da Igreja, as mudanças possíveis a partir de nós mesmos. Cada pessoa tens dons e competências a colocar ao serviço do bem comum. Dizemos com Paulo, na Segunda Carta aos Coríntios: «há diversas operações, mas é o mesmo Espírito que opera tudo em todos». Quer cantemos, quer estejamos a proclamar alguma leitura, quer na presidência da eucaristia, na proclamação da homilia, na distribuição da comunhão, no serviço aos pobres, aos presos, aos refugiados, no sonho de uma Igreja em renovação sinodal, «é o mesmo Espírito que opera tudo em todos», pois em cada pessoa, em cada um, se manifestam os dons do Espírito, a colocar as nossas competências, saberes, experiências de vida, o dom de nós mesmos, seja qual for a nossa condição, ao serviço «do bem comum.
A nossa querida Ana Fragoso, daqui a pouco, vai ser por mim, solenemente, nomeada (o termo é mesmo este) acólita, para o serviço do altar na celebração da eucaristia na nossa Comunidade. O rito consta de três momentos: um diálogo entre mim (Capelão) e a Ana a perguntar-lhe se ela quer servir o altar. A resposta já está pronta há mais de três anos. Faço, de seguida, uma oração sobre a alva. Depois a Ana será revestia com a alva própria dos ministros, a recordar a veste batismal. Para chegar a este momento, percorri com a Ana e a sua família um caminho de discernimento. Como todos podem comprovar: a Ana sabe o que faz e sabe o que está a fazer (em que contexto está a agir). Já o demonstrou desde o primeiro dia que passou a servir o altar. Em cada gesto coloca doçura, serenidade e beleza. Cada gesto é, suavemente, bem feito. E o modo como o faz aqui é o modo como também prepara a mesa em sua casa: a mesma serenidade, a mesma leveza, a mesma solenidade.
Neste dia de PentecosteS, antes da proclamação do Evangelho, há um belo cântico da tradição gregoriana, Veni Sancte Spiritu, obra prima do canto litúrgico da tradição latina. O Pepe compôs para a versão portuguesa, Vinde, ó Santo Espírito, uma música, hoje estreada. Foi também um dos momentos de novidade e de inspiração na Solenidade de Pentecostes este ano em nossa Comunidade. Em nossas dores, tristezas, fragilidades e cansaços, confiemo-nos à força consoladora do Espírito. Imploremos-lhe alegria, gozo, cura, alívio: «Vinde, Pai dos pobres: na dor e aflições, vinde encher de gozo nossos corações»; «Abrandai durezas para os caminhantes, animai os tristes, guiai os errantes».
Pe. António Martins, Domingo de Pentecostes