Queridas Irmãs
Queridos Irmãos

Avançamos no tempo pascal e aproximamo-nos do Pentecostes, que será celebrado daqui a duas semanas. É o grande acontecimento pascal do dom do Espírito Santo, sopro interior vida nova. Mas podemos dizer que a Páscoa é já Pentecostes, porque a ressurreição de Cristo e a nossa acontecem pela força do Espírito Santo. Como escreve o Apóstolo Pedro, na segunda leitura: «[Cristo] morreu segundo a carne, mas voltou à vida pelo Espírito». E volta à vida, pelo Espírito, para nos vivificar, para nos acrescentar vida.
O universo inteiro, toda a humanidade, a Igreja no seu todo, cada comunidade cristã concreta, cada pessoa em sua singularidade, está habitada, por dentro, por uma torrente interior de vida e respiração que tudo renova, o Espírito Santo. Dom que precisamos continuamente desejar, pedir sem cessar, intensamente querer para o sabermos acolher e agradecer. Não cesse em nós este grito: «Enviai, Senhor, o vosso Espírito e renovareis a face da terra» e, podemos acrescentar, o interior dos corações e das consciências.

No evangelho de João hoje lido, Jesus, antes da sua paixão, morte e glorificação, prepara e consola os discípulos para o tempo da sua ausência: «Não vos deixarei órfãos: voltarei para junto de vós». Volta ressuscitado para soprar sobre eles o Espírito Santo, e os encorajar a sair do confinamento do medo. O Senhor volta, continuamente, para junto de nós; por outras palavras, permanece presente no seu Espírito a levedar e a inspirar as nossas consciências. A nossa esperança está fundada na sua promessa de amor e de vida: «Eu vivo e vós vivereis»; «Quem me ama será amado por meu Pai e eu amá-lo-ei e manifestar-me-ei a ele». O amor de Jesus por nós não é apenas memória do passado; é promessa de futuro, rasga em nós inexplorados e sempre novos horizontes de esperança.

Não nos deixa órfãos, desamparados, entregues à nossa solidão; volta, continuamente, para nós e permanece presente no dom do Espírito Santo. Na linguagem de João, o «outro Paráclito». Um pormenor do evangelho de João: recebemos o dom do Espírito através da intercessão do Filho; Jesus é aquele que, incessantemente, suplica ao Pai o dom Espírito que garante a memória das suas palavras e gestos e nos abreve ao conhecimento das coisas futuras. Porque a Palavra de Jesus é contínua fonte de revelação interior, um crescente conhecimento de amor. «Eu pedirei ao Pai, que vos dará outro Paráclito, para estar sempre convosco». «Outro Paráclito», outro advogado, outro consolador, outro interprete, outra pessoa que vem em socorro do nosso grito e da nossa carência, o Espírito da Verdade.

O nosso primeiro advogado (paráclito) é o próprio Cristo que conhece na própria carne os caminhos da nossa frágil humanidade. «Temos um Defensor (parakletos) junto do Pai, Jesus Cristo, o Justo» (1 Jo 2,1). O Paráclito habita em nós, está no meio de nós, é o meio onde existimos, o oceano de vida que nos envolve e que nos faz viver. Não estamos sós, não caminhamos desamparados. O Espírito Santo, o Paráclito, vem em socorro da nossa pobreza, para nos consolar e animar, encorajar e fortalecer. Ele é quem interpreta na singularidade da nossa existência o evangelho do Senhor. Pelo Espírito, a existência crente de cada um de nós é uma nova, inédita e irrepetível interpretação.

Pede-nos o Papa Francisco que celebremos esta semana, com gestos concretos os cinco anos da publicação de Laudato si`, esse documento profético que a Igreja oferece ao mundo e aos próprios crentes. Possa ser esta semana uma ocasião para nos interrogarmos, mais uma vez, sobre o nosso cuidado pela criação, renovarmos a consciência que tudo está interligado. E de crescermos numa espiritualidade verdadeiramente ecológica: «A espiritualidade cristã propõe uma forma alternativa de entender a qualidade de vida, encorajando um estilo de vida profético e contemplativo, capaz de gerar profunda alegria sem estar obcecado pelo consumo» (LS 222).

Este tempo de confinamento serviu, certamente, para renovar a nossa forma de habitarmos em nossas casas, pois aí permanecemos tanto tempo, para nos relacionarmos uns com os outros com maior cuidado e atenção, para tomarmos consciência de que podemos habitar o mundo com ritmos de vida mais lentos e menos consumistas. Foi possível nestes dias, será possível também no futuro. O que, entretanto, aprendemos possa constituir uma bússola para nos orientarmos no futuro. É possível habitar o mundo de outro modo; e já o ensaiamos. Escreveu recentemente o ecoteólogo brasileiro Leonardo Boff: «Se não fazemos uma “conversão ecológica radical”, nas palavras do Papa Francisco, a Terra viva poderá reagir e contra-atacar com vírus ainda mais violentos». A presente crise pandémica pode ser acolhida como «uma chamada urgente a mudar a nossa forma de viver na nossa Casa Comum».

Desafia o Apóstolos Pedro aos cristãos de todos os tempos, e a nós, em particular, no tempo desafiante que atravessamos: «prontos sempre a responder, a quem quer que seja, sobre a razão da vossa esperança». Possamos e saibamos dar razão da nossa esperança nos contextos em que vivemos, nas profissões que realizamos, nas casas que habitamos, nas empresas que servimos, no tecido das nossas relações. Porque a razão da nossa esperança é Cristo ressuscitado. Uma esperança que brota dos abismos da morte como promessa de vida em abundância.

É uma esperança que promete futuro. Promete e garante, porque esse futuro já começou.

Pe. António Martins, VI Domingo da Páscoa