O cardeal D. José Tolentino Mendonça presidiu hoje à missa na capela do Rato, em Lisboa, tendo sublinhado a incansável proximidade de Deus com cada ser humano, que sempre possibilita os recomeços, e destacou que cada pessoa pode ser ser bênção e agente de transformação da cultura.

«Deus é favorável, Deus está disposto a dar um investimento de vida, Deus é um sim à nossa vida», e não uma porta fechada», porque a humanidade «não é uma coisa perdida», declarou na homilia, antes de frisar: «Deus ama a nossa humanidade, Deus extasia-se como a nossa humanidade, com aquilo que somos».

Na história de cada ser humano, que «é de luta, mendicante», uma das tarefas mais difíceis «é a de nos amarmos a nós próprios», o que só é possível «se formos ajudados pelo amor incondicional de Deus».

Ao regressar a uma comunidade a que presidiu até 2018, quando foi nomeado arcebispo pelo papa Francisco, o cardeal Tolentino lançou um convite para «o primeiro dia do ano», Dia Mundial da Paz, em que «o coração como que bate de novo pela primeira vez»: Sintamo-nos amados, que esse amor nos cure e transforme».

«Deus é cúmplice dos nossos recomeços», ao investir em cada pessoa «a confiança necessária» para fazer «do tempo uma história» em que «a vida se relança, ilumina, resgata, consolida», afirmou, para a seguir acentuar que n’Ele se encontra «o porto de abrigo, o Pai misericordioso, o Pai compassivo, sempre disposto a ver o bem».

Ao comentar as leituras bíblicas da celebração que assinala a solenidade de Santa Maria, Mãe de Deus, o bibliotecário e arquivista da Santa Sé interrogou: «Do ponto de vista racional, parece um absurdo: como é que uma humana, Maria, pode ser mãe de Deus?».

«A tradição mais antiga eclesial celebrou Maria com este título, um dos mais primitivos títulos marianos», atingindo um «plano que a razão declara como absurdo», mas «a fé como verdadeiro».

Para D. Tolentino, «o grande remédio» da existência «é o amor», e uma das suas sementes é ter a capacidade de dizer «o bem»: «Vivemos dentro de uma cultura que é o contrário, que lamentavelmente nos leva a viver numa crítica constante, pouco construtiva, em que vemos sobretudo o mal; os nossos olhos parecem profissionais que só veem a parte negativa, deixamo-nos consumir numa espécie de lamúria, lodaçal escuro, noturno, onde só vemos o mal».

Um dos propósitos prioritários do novo ano devia ser «abençoar»: «Há uma bênção quotidiana, secular, humana, que todos podemos dar uns aos outros», desejando «o melhor para cada um», em contraposição a uma cultura «onde o bem é silenciado, como se não tivesse lugar no espaço público».

«Só conseguiremos domar o lobo que existe no coração» se houver a capacidade de transformar «a agressividade e escuridão numa forma de luz, numa coisa que se acende», porquanto a humanidade de cada pessoa «é o lugar para hospedar e expandir Deus no mundo».

E dado que a paz é um dom que se recebe e partilha, é necessário que o ser humano se comprometa com um estilo de vida marcado pela «compaixão, a misericórdia, o bem», assinalou.«Que os propósitos que o Espírito Santo faz vir ao nosso coração» no primeiro dia do ano sejam acolhidos como «um programa de vida», para que a existência de cada pessoa não seja apenas «a passagem do tempo», mas «um tempo oportuno» para a relação com Deus, concluiu.

Rui Jorge Martins
(in https://www.snpcultura.org/Deus_e_um_sim_a_vida_nao_porta_fechada_cardeal_tolentino_mendonca.html)

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