A proposta de um percurso pelo Livro dos Salmos, sob o signo da música, tem múltiplas portas de entrada. Não precisamos de ficar reféns da discussão acerca da sua origem histórica ou presos às indicações explícitas das práticas musicais que os próprios salmos descrevem. Precisamos apenas de recordar que se trata de poesia orante. Poesia que habita milenarmente as vozes dos crentes, nas suas comunidades, como um contínuo partilhado. Talvez seja na leitura ou no canto de um salmo que mais facilmente experimentamos algo de decisivo para condição crente: sentir-se gerado.

Propõe-se, no dia 22 de maio, pelas 18h30, na Capela do Rato, um encontro, meditativo e comentado, com alguns lugares da grande tradição da música ocidental, descobrindo aí modos de ler a literatura sálmica. Os salmos habitam os ritos cristãos, e esse foi o habitat de grande parte da criação musical europeia. Nessa rota histórica, sabemos, esses ritos perderam alguma da sua força social, mas não pode dizer-se o mesmo dos salmos. Para além dos contextos rituais e litúrgicos, a criação musical descobriu nos salmos uma palavra vibrante sobre os enigmas da experiência humana.

No Saltério dos Huguenotes, nas linhas polifónicas de Josquin des Prez, na vocalidade do romantismo do século XIX, nos trânsitos que habitam a música de Stravinsky, Honegger ou Bernstein, na espiritualidade de Schnittke, Rautavaara ou Pärt, na etnicidade dos cantos espirituais negro-americanos, na música telúrica de Cyrillus Kreek, na contemporaneidade urbana de Reich, Lang ou Cohen, descobrimos o rasto de uma leitura ecuménica (ou seja, universal) dos salmos. Os salmos tornam-se assim uma palavra de abertura e de acolhimento.