Minhas queridas Irmãs
Meus queridos Irmãos

Todos sabemos bem por experiência: esperar, e esperar quando a vinda de alguém está eminente, cria tensão, expectativa, uma palpitação ansiosa de coração. Diz a sábia raposa ao Principezinho:

«Teria sido melhor voltares à mesma hora, disse a raposa. Se tu vens, por exemplo, às quatro da tarde, desde as três eu começarei a ser feliz. Quanto mais a hora for chegando, mais eu me sentirei feliz. Às quatro horas, então, estarei inquieta e agitada: descobrirei o preço da felicidade! Mas se tu vens a qualquer momento, nunca saberei a hora de preparar o coração…».

É certo que as relações precisam de ritos, mas o incerto e o não programado é o que faz a sua maravilha, e também o seu drama.

A espera antecipa a presença da pessoa que está para vir. Como também os grandes e decisivos acontecimentos da nossa vida, aqueles que conseguimos prever e organizar com antecipação, estão marcados pela natural tensão entre o desejo e o receio do seu acontecer. Não há futuro sem advento, sem busca, sem esperança, sem desejo. Todas as relações abertas ao futuro são promessa de um porvir, incerto e desconhecido ainda, mas querido e desejado, precisamente, na vinda do outro.

Em sentido litúrgico cristão, falamos de Advento como o tempo que antecede e prepara o Natal, o mistério da vinda de Deus à nossa frágil humanidade. É um tempo de densidade espiritual, marcado por uma nota de contensão, de concentração e de atenção; desafia um olhar para dentro revendo comportamentos e atitudes. Mas o Advento tem também, e essa é a sua nota primeira, a dimensão de orientação para a plenitude que é Cristo, o futuro (já presente) que nos atrai e nos espera.

Com a leitura de hoje de Lucas, o evangelista que nos acompanha este ano, a liturgia quer assinalar esse sentido de Advento que é a orientação da história humana, da nossa existência crente, de toda a Igreja para Cristo, nossa meta e finalização. Contudo, a vinda do Reino esperado acontece dentro dos dramas violentos da história e das alterações cósmicas. Não é mero caminho evolutivo; há um mundo antigo, velho, marcado pelo caos destruidor da violência e da morte que precisa de ser redimido. Por isso precisamos de pedir, continuamente, com o salmista: «Mostrai-me, Senhor, os vossos caminhos, ensinai-me as vossas veredas».

O fim esperado ajuda-nos a atravessar e a viver as tensões, as crises, a dureza e a violência imprevista do quotidiano, o inesperado de situações limite em que somos por inteiro postos à prova, no corpo e na alma. Os traços de linguagem apocalítica do texto de hoje assinalam que a manifestação de Cristo na glória será precedida de acontecimentos perturbadores. Haverá guerras, violência aos cristãos, abalos cósmicos… O caos/a desordem é uma possibilidade a não descurar no evoluir da história humana… não por vontade de Deus, mas como resultado das nossas opções. O mundo revela-se como um lugar perigoso: nada nem ninguém está em segurança.

A Palavra do evangelho de hoje, através da simbólica apocalítica, procura despertar nos fiéis uma consciência crítica. Cristo apela-nos a uma vigilância atenta, a um estar despertos perante o que acontece: «vigiai e orai em todo o tempo». Para não sermos apanhados desprevenidos nem ficarmos vencidos, interiormente, pela violência imprevista dos acontecimentos. Podemos crescer, através deles, em confiança, em esperança, em solidariedade e cuidado atento uns dos outros. Os mais perturbadores acontecimentos, os mais insólitos sinais cósmicos (as alterações no sol, na lua, nas estrelas, a agitação do mar e a angústia das nações) têm, paradoxalmente, uma dimensão positiva: podem ser atravessados com fé e esperança, como acontecimentos libertadores e não esmagantes, como oportunidades salvíficas e não como armadilhas: «Quando estas coisas começarem a acontecer, erguei-vos e levantai a cabeça, porque a vossa libertação está próxima».
Na linguagem de Lucas, os nossos corações podem ficar pesados, obscurecidos e embriagados com a vertigem dos acontecimentos, com as seduções dos estilos de vida contemporânea (de alta competição, de facilidade comunicativa, de solicitação ao consumo, de eficácia sempre exigida no desempenho …). «Tende cuidado convosco, não suceda que os vossos corações se tornem pesados pela intemperança, a embriaguez e as preocupações da vida». Podemos entrar nessa lógica dominante e perdermos o sentido do humano e de toda a fragilidade e imprevisibilidade que o marca. Podemos cair no risco da insensibilidade às dores do mundo de hoje, dos nossos irmãos, dos familiares mais próximos, e até às nossas dores interiores, tão silenciosas e fundas… Podemos alinhar com a lógica da violência do mais forte, com manipulação fácil das emoções e dos sentimentos, como fazem hoje os populismos. Há tantos modos de ficarmos embriagados, indiferentes ao drama do mundo. Isso, na linguagem de Lucas, seria cair numa armadilha, numa ilusão (embriaguez) que nos tornaria prisioneiros, quais presas de uma lógica dominante que nos quer anestesiados para assim, mais facilmente, nos instrumentalizar e nos manipular.

Na esperança da sua vinda, o Senhor nos «faça crescer e abundar na caridade uns para com os outros», como nos apela S. Paulo na segunda leitura.

Pe. António Martins, Domingo I do Advento

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