Queridos irmãs e irmãos,

Nós lemos neste dia o livro do Génesis. É interessante que pensando no símbolo da árvore de Natal nos perguntemos como é que ele surge. Ele surge porque, no final da Idade Média, se começou a representar no dia de Natal, às portas da Igreja, precisamente este texto do livro do Génesis. Colocava-se uma árvore e havia um diálogo entre Deus, Eva e Adão, e este diálogo antecedia o começo da celebração. Como era no inverno e como se pressupôs que o fruto da Árvore Original era uma maçã e no inverno não havia maçãs – agora há todo o ano- então pendurava-se um fruto a fazer de maçã. Por isso é que aquela árvore começou a ser decorada com frutos não naturais. Aos poucos, ali na região da Alsácia, na Alemanha, começou esta tradição há quatro séculos atrás de construir no Natal uma árvore. E nós encontramos as primeiras estampas de Natal e as primeiras descrições de uma árvore de Natal e o efeito que ela tem sobre o olhar das crianças e sobre o coração dos adultos. Por exemplo, no Werther do romance do Goethe aparece uma das primeiras descrições de uma árvore de Natal.

É muito belo como estes símbolos falam. A árvore de Natal o que é? É a Árvore da Vida, é a árvore que representa esse momento inicial do drama humano, do drama do pecado e da Graça, de como Deus não desiste da nossa história. Aquela árvore que primeiro foi o lugar da tentação depois tornou-se em Árvore da Vida. Porque foi numa árvore da Vida, num madeiro da Vida que o nosso Salvador foi crucificado. Então, aquela árvore tornou-se a árvore que simboliza para nós a própria salvação.

Nós, cristãos, lemos a história em chave de renovação. A história nunca está perdida, nós nunca podemos dizer: “ É irremediável, é irrecuperável, não há nada a fazer.” Pelo contrário, sentimos que a história é tornada reversível, o que era o fim pode ser um princípio porque Deus investe aí a Sua Graça. Mesmo em relação à história humana, nós podemos pensar: “O Homem é pecador, o Homem é frágil, o Homem tem dentro de si esta luta terrível entre o bem e o mal e tantas vezes é o mal que vence e o bem fica oprimido, fica adiado nos nossos corações.” E, contudo, nós ouvimos, como ouvimos hoje nesta leitura da Carta aos Efésios, e ficamos siderados com as coisas que S. Paulo diz olhando para o ser humano com os olhos de Deus: “Não, não, não és um ser perdido, pelo contrário, és predestinado, és amado, és preparado, és trabalhado para receber a Graça, para seres o cântico de louvor, para seres o lugar onde a luz brilha, onde Deus habita.” O cuidado, o amor que Deus investe na nossa humanidade!

Queridos irmãs e irmãos, em tempo de Advento é tempo para olhar para a humanidade com os olhos de Deus, como o lugar sagrado, a história sagrada por excelência e acreditar que nada é irreversível, que nós não podemos tornar fatal a nossa história, acreditar que há um fado destrutivo em relação àquilo que somos. O Cristianismo vem desfatalizar a história, abrir a história neste Deus que assume a nossa condição humana. E por isso nós, recuperando as narrativas evangélicas, construímos nas nossas casas o presépio, e vamos construir também aqui na nossa Capela o presépio, que é no fundo o Deus que Se faz menino, que como todos nós começa assim a Sua história. Um Deus que encarna na nossa carne, na vitalidade tipicamente humana, nesta mistura de carne e de sonho, nisto de cinza e de infinito que cada um de nós é o próprio Deus vive também a Sua aventura.

Ele vem para nós podermos ser. Deus torna-se o Homem para que o Homem se sinta divino. E é tão importante que neste tempo de Advento cada um de nós se sinta divino, porque cada um de nós é divino. Aquilo que nos habita, o sopro que nos habita é um sopro divino. Por isso, a nossa vida é chamada a refletir essa luz, a refletir essa verdade essencial que repousa sobre cada um de nós e que repousa sobre cada criatura. Nós temos a missão de avivar, de dizer isso, de dedicar aos outros palavras de afeto, de entusiasmo, de consolação, de exortação. Porque cada um de nós é uma coisa de Deus, é uma presença de Deus, é uma teofania, é um lugar onde Deus Se manifesta, é um sorriso de Deus, é uma expectativa de Deus. E isto tudo de uma forma muito concreta. Nós hoje celebramos Maria. Quer dizer, no Cristianismo não são ideias, são vidas, vidas concretas. Sabemos os nomes, a biografia conta, a nossa história é para aqui reclamada, é esse o compromisso. Há uma história concreta que nós contamos. A história desta rapariga chamada Maria que vivia em Nazaré, que tinha um noivado com um homem chamado José, a história do que ela sentiu, de como Deus vem à sua vida, de como ela fica perturbada com a grandeza daquilo que lhe é pedido, mas como ela na sua humildade confia e diz “Sim”. Diz ”Sim”, “Fiat”, “Eu sou a escrava do Senhor, faça-se, cumpra-se, realize-se”. E num “Sim” a história abre-se, a história reabre-se, torna-se o rio de Deus, a torrente por onde a Graça de Deus passa. Hoje nós celebramos o “Sim” de Maria mas pedimos a Deus a força para cada um de nós dizer “Sim”, dizer “Faça-se”, dizer “Cumpra-se”. Porque é quando dizemos isso na nossa humildade – e ninguém é mais humilde do que Maria – “Sim, faça-se” que de facto há um rio transbordante de Graça, de vida, de entusiasmo, de uma forma que até nós não sabemos.

Nós pensamos: Maria tinha consciência de tudo? Não, entregou-se, disse “Sim”. Que, do fundo da nossa vida, nós também possamos dizer “Sim” a este Deus que vem, que vem até nós e vem através de nós.

Pe. José Tolentino Mendonça, Solenidade da Imaculada Conceição

Clique para ouvir a homilia