Queridos irmãs e irmãos,

Aleluia! Depois da Quaresma que vivemos, em que nos privamos desta palavra, hoje, nesta manhã, nós dizemos com toda a alegria: “Aleluia!” E dizemos nesta palavra toda a esperança, toda a luz, toda a transformação, toda a vida nova, toda a primavera que para nós rebenta na Boa-Nova da Ressurreição de Jesus. Aleluia!

Quando o Cardeal Lustigier, que era arcebispo de Paris, entrou como membro da Academia de França, uma distinção muito importante, ele que era de famílias judias (os seus pais eram judeus), ele era um convertido, mas cristão, perguntaram-lhe qual era a palavra mais bela que ele conhecia em francês. E ele disse: “Para mim, a palavra mais bela em francês é a palavra «aleluia» ”. Que não é de maneira nenhuma uma palavra francesa, é uma palavra hebraica, mas é uma palavra que é a mais bela palavra em todas as línguas.

Também em português a palavra mais bela é a palavra “aleluia”. Porque é aquela palavra que inaugura um mundo novo dentro de nós, é aquela palavra que derrota a irreversibilidade da vida, é aquela palavra que desfataliza a história, é aquela palavra que inaugura uma brecha, de um modo novo, de uma visão nova sobre a própria realidade. A palavra “Aleluia” não é apenas uma única palavra, não é apenas a mais bela das palavras. Nós, cristãos, temos a responsabilidade de fazer desta palavra não apenas uma frase que dizemos, não apenas uma conversa que mantemos mas temos a responsabilidade de tornar esta palavra uma nova língua, uma nova forma de comunicação humana. Uma maneira diversa de relação entre os Homens, um modo novo de habitar o mundo, uma forma completamente inédita de habitar a própria realidade.

Porque o nosso ponto de partida é o “aleluia.”Não quer dizer que não exista as lágrimas e o luto, não quer dizer que não exista a ameaça e o cerco, não quer dizer que não exista o Calvário e os sofrimentos, não quer dizer que a ferida permaneça e nos próximos domingos havemos de meditar como no corpo do Ressuscitado a ferida permanece. O nosso corpo insurreto, o nosso corpo hoje levantado, o nosso corpo desfatalizado, o nosso corpo que é chamado a acreditar na vida não deixa de ser um corpo vulnerável, não deixa de ser um corpo ferido. O nosso amor, a nossa fé, a nossa esperança continuam a ser inacabados e imperfeitos. Mas levantados do chão, mas erguidos nessa esperança, mas alçados por essa força que o próprio Cristo nos dá.

Porque é que foi Madalena a primeira testemunha da ressurreição, perguntamos nós. Porque é que Pedro e João chegaram a seguir? Porque foi ela cumprir, como tantas vezes cabe na história às mulheres, cumprirem os ritos de piedade, manterem o coração com a dor dos outros, capaz de se compadecer do sofrimento dos outros. Talvez na história e na vida essa função tenha sido desde sempre mais desempenhada por mulheres, e por isso foi Madalena a primeira a acorrer ao sepulcro. Mas há também uma outra razão: é porque Maria Madalena, quando encontrou Jesus, ela vivia como que exilada da sua vida. O Evangelho de Lucas diz-nos que ela era possuída por demónios, isto é, que ela não era dona de si, que ela era escravizada pela vida, pelas tentações, por esta força demoníaca. E no encontro com Jesus esta mulher descobriu uma vida nova.

Porque é que Madalena foi a primeira testemunha da Ressurreição? Porque só aqueles que estiveram como mortos percebem o limiar da vida, percebem mais cedo o limiar da vida. Só os desesperados, os infelizes, aqueles que se atiram completamente para os pés de Jesus, aqueles que não têm outro caminho, aqueles que dizem: “Senhor, Tu és o Caminho, a Verdade e a Vida.”, esses são os primeiros a perceber a Ressurreição. Para esses é a primeira fala de Cristo, e depois para todos os outros, e depois para todos nós, que hoje somos chamados a acreditar para ver, hoje somos chamados a aprofundarmos a nossa fé para vermos Cristo ressuscitado. Isto é, para vermos o destino do mundo de uma outra forma.

Queridos irmãos, esta é a maior das pretensões cristãs. A mais desvairada, a mais louca, a mais inacreditável das pretensões cristãs. Acreditarmos que há homem na história que ressuscitou, e que esse gesto que nos espanta, que nos abisma é o princípio de uma vida nova, de um destino humano novo. E se há alguma verdade a que um cristão é chamado a acreditar é na verdade da ressurreição dos mortos. É isso a grande diferença cristã, é sairmos daqui e dizermos eu acredito que Jesus ressuscitou e fazer desse ato de fé, fazer dessa confissão o motor transformador de uma vida. Porque se eu acredito que Aquele que está numa cruz agora vive, então a existência tem de ser vivida de uma outra forma.

Queridos irmãos, aleluia! Aleluia! Que cada um de nós possa sentir que esta palavra é dita ao seu coração, àquilo que neste momento preciso está a viver, àquilo que gostava e que não gosta, àquilo que evita, àquilo que sonha. Aleluia! Esta palavra é dita a cada um de nós, mas cada um de nós leve esta palavra, leve esta palavra no seu coração. Repitamos esta palavra àqueles que vivem connosco, àqueles que estão ao nosso lado (aos nossos filhos, às nossas mulheres, aos nossos maridos, aos nossos amigos, aos nossos inimigos), àqueles que estão perto e àqueles que estão longe, aos conhecidos e aos desconhecidos. Levemos no nosso coração esta palavra que é um programa, que é um projeto. Aleluia.

Pe. José Tolentino Mendonça, Domingo de Páscoa

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